sexta-feira, 4 de maio de 2012

Paraíso

Se o Paraíso é uma festa, eu quero morrer e assombrar a minha própria casa.
Muito depois de toda a minha família ter saído dela, e durante todo o tempo em que ela decair em escombros. Eu vou apreciar cada segundo do silêncio que se abasterá sobre o meu antigo quarto. Eu vou dançar na cozinha onde eu nunca verdadeiramente pus os pés.
Se o Paraíso é um bordel, tocando jazz sensual e lento toda a noite, lindas garotas fazendo strip, e uma solidão que não termina, eu estarei lá.
Posso muito bem já ter chegado lá, e só não ter me dado conta. "Lá" pode ser na verdade "aqui", e com certeza se faz sentir dessa forma.
Se o Paraíso é uma conversa animada com pessoas interessantes, e tão veloz que não se vê o tempo passar, eu vou para o Inferno.
Se o Paraíso é a morada dos homens que produzem como árvores, constróem como se elevassem impérios, mas não vêem motivos para sorrir, eu aconselho desde já: pare de trabalhar e assombre a sua própria casa. Porque os opostos se confundem completamente aqui. Nada é absoluto ou absolutamente, e esses dois extremos não se misturam e equivalem a um ponto mediano; pelo menos, não todo o tempo. Não seria este o Inferno se não se pudesse ser mediano, medíocre, vulgar e banal por um momento, ou mais de um, ou mais de uma dessas qualificações em mais de um sentido ao mesmo tempo.
Se o Paraíso é reservado para os virtuosos, os que abdicam da refeição completa pelas sobras, pelo próximo, os que se completam, eu encontrarei os outros, os deixados de lado, no Inferno.
Eu sou a Ira, a ganância, a luxúria, a gula, o orgulho, a inveja, e um minuto de preguiça para aproveitar tudo isso.
Eu quero uma refeição completa, nada de sobras. Eu estou cercado de pecados, capitais, os mais abissais, e eu não me sinto no Inferno. Então talvez, o que me falte seja simplesmente mandar a mim mesmo pra lá.
Que eu pra sempre mande a mim mesmo pro Inferno.
Pro Inferno comigo mesmo.