sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Prematuro, Parto, Fórceps

Eu vejo tudo de cima de um muro. E assim dividem-se territórios, estabelece-se a fronteira, fico no limiar. E quem nunca se protegeu? O instinto de sobrevivência existe em todos nós; e todos nós nos defendemos o tempo inteiro. E quem não tem defesa, ataca; quem não faz nenhum dos dois, entra na ambulância de maca. Eu posso olhar pra baixo e ver uma vida passando debaixo dos meus pés. Eu vejo formigas trabalhando, eu vejo gente sonhando coisas diferentes, vejo falhas, sucessos, orações, blasfêmias, e de cima do meu muro, eu me equilibro como numa corda-bamba. Mas é confortável aqui. O frio desce nos meses mais gelados e a brisa fresca ajuda a aliviar o calor do verão. Mas se eu pudesse, desceria. Seria menos confortável. É complicado andar pra frente num muro como corda-bamba. No meio-termo de dois pólos, duas órbitas revolventes, algo como um refrão de bolero. Posso ver daqui o riacho aonde eu lavo a minha culpa, exumo meus cadáveres, lavo minhas mãos. Desse muro alto, dá pra ver o céu azul, que às vezes fica cinza, às vezes torna púrpura, vermelho, negro, mudando de tom, tanto como eu. Dá pra ver isso tudo e rir com sarcasmo. O que seria da convivência comigo mesmo, não fosse o sarcasmo? Eu posso rir de tudo, como uma Hiena. E daí se eu não sei sentir? Que se tem pra sentir em cima de um muro?
Eu vejo tudo de cima de um muro, e desse muro alto eu vou ver cair do céu lágrimas de despedida.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Amor Não É Suficiente

O que seria do amor não houvesse a dor do poeta? Seria algo que teríamos esquecido, como o latim? Seria a linguagem universal de um mundo por baixo do mundo - por dentro do mundo - onde os sofredores dialogariam suas condenações eternas, seu arrependimento interminável de ultrapassar os limites da razão para o espaço Além? Seria a salvação, ou arma biológica?
O que seria do mundo se ainda houvesse o amor? Somos nós os responsáveis, mas isso nos faz os assassinos ou os justiceiros? Fizemos o que podíamos pra sobreviver, como sempre fazemos, como tudo o que fazemos. Crucificamos o amor, e os últimos filhos do Homem estão sendo caçados; é a temporada de caça às bruxas. Os amantes carregam cruzes, cercados por uma floresta de concreto, aonde a vida é dura, já o tenha dito um velho sábio, sábio poeta, que cantava o amor.
O que seria de mim se eu soubesse a linguagem do amor? Seria mais completo, ainda mais simples, ou seria mais um ladrilho na avenida? Substituiria o foco das minhas preocupações, perderia o fogo de viver, acenderia a vontade? Mas eu nem sei o que é amar direito. Não saberia definir se me pedissem. E não sei se isso me faz tanta diferença. Talvez um dia eu saiba a diferença; talvez saber a diferença seja a resposta, a diferença em si.
Talvez um dia eu pare de me perguntar esse tipo de coisas.